São Paulo celebra centenário da Semana de Arte Moderna

A Semana de Arte Moderna de São Paulo aconteceu entre os dias 13 e 17 de fevereiro de 1922 no Theatro Municipal de São Paulo, e marcou a consolidação do modernismo no Brasil. Foi um momento de ruptura entre as culturas tradicionais, impulsionado por grandes nomes da época como Mário de Andrade – um dos principais articuladores da manifestação –Oswald de Andrade, Graça Aranha, Menotti del Picchia, Ronald de Carvalho, Anita Malfatti, Victor Brecheret, Di Cavalcanti e Guiomar Novaes. O que poucos sabem é que a Semana de Arte Moderna de 1922 não durou uma semana, mas apenas três – intensas – noites, como conta a diretora geral do Theatro Municipal, Andrea Caruso. “Foram três noites de apresentações de dança, música, recital de poesias e exposição de pinturas e esculturas no Theatro. O músico Heitor Villa-Lobos, que se tornou uma das principais referências da construção da música brasileira no século 20, esteve presente todos os dias, tocando obras de câmara de sua primeira fase. Era a primeira vez que ele se apresentava em um grande teatro.”
O evento, que questionava paradigmas estéticos e culturais e queria romper com o conservadorismo vigente da época, foi muito bem sucedido em seu intuito e cujos desdobramentos, entre os quais a antropofagia de Oswald de Andrade, ganharam, e ganham, repercussão até hoje, segundo Andrea. Entre os principais pontos da Semana, segundo Andrea, está o fato de “o nosso modernismo, ou nossos modernismos, serem assuntos de diferentes gerações e seguem sendo matéria de discussões, de embates estéticos e artísticos. Temos, no Theatro, registros das comemorações feitas a cada década, a partir de 1972, quando se comemorou o cinquentenário da Semana, e, com o passar dos anos, observamos as mudanças de perspectivas, abrindo novos leques de reflexão, sobre o que se disse e o que se registrou, o que não foi dito, o que faltou.
Antropofagia
Não obstante, um dos nomes de que muito se fala quando o assunto é a Semana de Arte Moderna de São Paulo, e que impulsionou a antropofagia de Oswald de Andrade, é Tarsila do Amaral. Mesmo sem ter participado presencialmente do festival – ela estava em Paris – sua relevância é extrema, confirmada tanto pela história quanto por sua sobrinha-neta, Tarsilinha do Amaral de quem foi muito próxima até seu falecimento, quando tinha apenas oito anos.
Para Tarsilinha, o pensamento artístico da tia foi crucial para o país e sua história. “O movimento modernista influenciou até politicamente o Brasil, pois eles trouxeram ideias novas nas artes e ideias novas geram pensamentos novos.” Mas, o ponto mais importante desse momento histórico é a obra o Abaporu (1928). A tela foi criada por Tarsila para presentear o então marido, Oswald de Andrade que, ao colocar os olhos sobre ela, ficou encantado e cujos traços despertaram nele a ideia de criação do movimento Antropofágico. Considerada uma obra-prima da artista, o desenho sugere retratar a valorização do trabalho braçal com a figura de pés e mãos enormes, ao mesmo tempo que, contrariamente, desmerece o intelectual com sua cabeça minúscula.
“Só a Antropofagia nos une. Socialmente. Economicamente. Filosoficamente. Única lei do mundo. Expressão mascarada de todos os individualismos, de todos os coletivismos. De todas as religiões. De todos os tratados de paz. Tupi, or not tupi that is the question. Contra todas as catequeses. E contra a mãe dos Gracos. Só me interessa o que não é meu. Lei do homem. Lei do antropófago.” (Trecho do manifesto de Oswald de Andrade)
Tarsile-se
Tarsila do Amaral nasceu no interior de São Paulo, na cidade de Capivari, em 1886. Foi uma grande pintora e desenhista brasileira e conquistou reconhecimento internacional com a brasilidade intrincada em suas obras. Também foi membro do Grupo dos Cinco, formado por Anita Malfatti, Menotti del Picchia, Mario de Andrade e Oswald de Andrade, considerados os cinco artistas mais influentes da arte moderna brasileira.
Hoje, está entre as mais importantes artistas brasileiras, e seu Abaporu, uma das telas mais conhecidas mundialmente, infelizmente, não está em casa. Foi arrematada, em menos de dois minutos, em um leilão em Nova York por US$ 1,3 mi em 1995 pelo colecionador Eduardo Constantini, e atualmente está em exibição no Museu de Arte Latino-Americana de Bueno Aires, na Argentina, o MALBA. Sempre com muito critério e com atenção especial à qualidade, Tarsilinha tem popularizado a arte da tia, organizando exposições, livros e outros produtos, inclusive, licenciamentos.
Celebrações do centenário no Theatro Municipal
Sendo o Theatro Municipal de São Paulo o epicentro da Semana de Arte Moderna de 1922, não poderia ser diferente ter uma extensa programação cultural para as celebrações desse centenário. “Para as comemorações, no período de 10 a 18 de fevereiro, teremos uma maratona com a apresentação completa das Bachianas de Villa-Lobos, pela Orquestra Sinfônica Municipal, a estreia da peça Muyrakytã, com coreografia de Allan Falieri para o Balé da Cidade de São Paulo, o lançamento da série Identidade Brasileira, do Quarteto de Cordas da Cidade de São Paulo, um programa da Orquestra Experimental de Repertório com peças de Villa-Lobos e Radamés Gnatalli e um programa de música coral brasileira especialmente preparado pelo Coral Paulistano para comemorar a Semana”, conta a diretora, e acrescenta: “além disso, teremos uma noite de sarau com a participação de importantes grupos como As Clarianas, Sarau do Binho e Sarau das Pretas; um show da rainha do carimbó, Dona Onete e da DJ Ju Salty; um ciclo de cinco encontros no Salão Nobre do Theatro discutindo aspectos relevantes da semana e suas atualizações; Expedições Modernistas, em parceria com o Museu da Cidade e a Biblioteca Mário de Andrade; dois processos teatrais que trazem para o diálogo os autores Oswald de Andrade e Graciliano Ramos; e o lançamento do projeto Essa noite se improvisa!, com apresentação do MC Max BO e DJ Nuts e com a participação livre de artistas que quiserem se inscrever duas semanas antes, pelo site do Theatro. Posteriormente, no decorrer do ano, teremos outras programações comemorativas, como, por exemplo, a montagem da ópera Café, com libreto de Mário de Andrade e música inédita de Felipe Senna”, finaliza Andrea Caruso.







